ENTREVISTA:
O objetivo dessas
entrevistas é ressaltar o modo próprio de ser da profissão e trabalho do
roteirista/argumentista nas obras de Historias em quadrinhos do RN, procurando
mostrar como e o por quê o roteirista faz suas escolhas em detrimento do
desenvolvimento de uma historia ao invés de outras. Buscando com isso,
responder para o grande público leitor de hqs o que os motiva ou faz optar por
contar historias do que ser um mero reprodutor delas. Além de compreender suas
reflexões, anseios e opiniões sobre os quadrinhos potiguares e suas
especificidades.
Inaugurando nossa
seção de entrevistas de roteiristas potiguares temos a satisfação de conversar um pouco e saber da
carreira e pensamentos do grande quadrinista e ilustrador Beto Potyguara sobre projetos, oficios e a arte de escrever roteiros de HQs. Iniciamos com uma pequena e resumida biografia do
entrevistado.
Roberto Flávio G.
de Lima ou como é mais conhecido “Beto Potyguara”, nasceu em Natal/RN em
outubro de 25/10/1971. Começou a desenhar desde 1984 e sua formação foram os
fanzines de papel até migrar para o universo Online.
1 – Bem agradeço
a disponibilidade de tempo, do ilustre roteirista para essa entrevista e já
começo perguntando o que o levou a fazer roteiros sobre quadrinhos?
A
necessidade de contar histórias. externar minha opinião, meus sentimentos,
minhas ideias e devaneios. a propósito, obrigado pelo “ilustre”.
2 – Ok, então
sabendo de suas motivações gostaria de aprofundar mais o conhecimento sobre as
hqs que te influenciaram, despertando você para esse universo dos quadrinhos?
Rapaz,
são tão diversas quanto o material que produzo. Os quadrinhos que me
influenciaram a criar minhas primeiras hqs inicialmente, foram os de humor
(turma do didi, peninha, zé carioca, condorito, recruta zero, piratas do
tietê...); passando pela efervescência na adolescência do supra sumo do
universo dos super-heróis (camelot 3000, esquadrão atari, x-men, novos titãs e
por aí vai); e um bocadinho mais tarde, por muito material autoral gringo,
quadrinho brasuca e europeu.
3 – Então,
observando suas motivações e influências quais os gêneros ou tipos de historias
você desejaria escrever para os futuros leitores de seus quadrinhos.
Na boa?
dar continuidade ao que já venho fazendo. Retomar o trabalho com tirinhas, que considero o maior
exercício e desafio narrativo e criativo pra quem se dispõe a contar histórias
e encontrar desenhistas que topem concluir séries já iniciadas que mesclam
aventura, ficção cientifica e humor.
4 – Muito bem,
gostaria de saber como é sua forma de escrever roteiros que abordem os mais
diversos temas, além de se possível for, me responder qual a sua posição quanto
a abordagem de temas delicados que por acaso você tenha escrito e que nem sempre são temas muito faceis de
serem abordados e aceitos pelo grande público leitor?
Bem
escrever no meu caso é 90% inspiração e 10% transpiração. Quando me comprometo
a “escrever”, geralmente só me levanto quando a série ou hq estão concluídas. As
hqs da maturi, assim como, o protótipo de “os notáveis” levaram menos de uma hora
para serem digitadas. A hq de carcará também foi fruto de uma tarde inspirada
(assim como esta entrevista). Me esforço para que cada série tenha a sua
própria assinatura. Assim boa parte das minhas tirinhas abordam temas
pertinentes e de crítica social, mas sempre com uma boa dose de humor, nada irônico
ou infame demais. só uma vez ameaçaram me pegar, após fazer uma charge sobre um
incidente envolvendo a polícia militar... escapei graças a fantástica ideia de
assinar com um pseudônimo.
5 – Você possui
alguma pretensão de desenvolver uma estética própria em sua escrita que tenha como
objetivo experimentar através de seus roteiros?
De
certo modo acho que já venho fazendo isso, com hqs experimentais visualmente e
conceitualmente: a série “minimals”, o texto cordelizado em “carcará”. Acho que
o caminho é por aí.
6 – Essa pergunta é capciosa, para não dizer
sacana, mas necessito fazê-la. Você se considera um roteirista de que tipo? Comercial
que escreve para vender e divulgar o seu trabalho apenas, Independente que objetiva
escrever para um determinado público, desejando uma liberdade maior de criação
ou ser Alternativo (underground) que procura a experimentação e a
liberdade de expressão, apenas, sendo que o público consumidor seria apenas uma
consequência e não o objetivo principal?
Sinceramente,
acho que me enquadro nesses dois últimos tipos. Minha recente formação em artes
visuais vem me influenciando a tentar algo cada vez mais próximo da linha do abstract comics. escrevo e desenho por
que me divirto com isso. Não me preocupo com os índices de aceitação ou
rejeição. Mas sou um profissional, e sempre estarei aberto a produzir obras de
encomenda, sem nenhum problema e sem
falsa hipocrisia. Afinal, o din-din no bolso propícia a publicação de novas
hqs.
7 – Muito bem,
considerando que como quadrinista inserido em uma região do país, a nordestina
em que temos a carência de tudo há décadas, qual a perspectiva atual do mercado
de Hqs nessa região e especificamente, o quadrinho potiguar?
Rapaz,
acho que ainda estamos bem distantes de poder utilizarmos a expressão “mercado”
no sentido estrito da palavra. O que existe hoje é um grande núcleo de produção
de quadrinhos em nossa cidade, principalmente. O que já é algo pra lá de
fantástico! a crescente participação dos artistas locais em eventos e
publicações externas e a criação de um calendário interno e regular de ações,
são um grande reforço em direção a esse ideal. A falta de um sistema de
distribuição eficiente, preços competitivos (sem perda de qualidade do material
comercializado), formação de leitores, força política da categoria, são apenas
alguns dos calcanhares de aquiles com que nos deparamos hoje. Mas sem dúvida
alguma, o momento de efervescência cultural é ímpar, o que nos faz acreditar de
que estamos trilhando o caminho certo.
8 – Nessa perspectiva,
gostaria de saber quais as hqs POTIGUARES lhe despertaram alguma curiosidade e
lhe surpreenderam em algum sentido, nesse ou em outros anos?
Ter uma
obra impressa publicada, na marra ou patrocinada, já é um fato digno de grande
reconhecimento e não deixa de ser uma
baita surpresa, dentro da conjuntura citada anteriormente. Muito
material de qualidade foi lançado por aqui, nos últimos quatro anos e tudo teve
início no universo digital, não no impresso. É certo que o lançamento coletivo do projeto primeira edição e o retorno das maturi’s tiveram um impacto importante e histórico para a produção
local, mas o alicerce desse grito independente surgiu mesmo, entre 2009 e 2010,
com as produções da k-ótica, da república dos quadrinhos e dos heróis
brasucas de francinildo sena. Foi uma
verdadeira enchente de títulos e de autores, como há muito não se via.
Diversidade aliada a qualidade vieram à
tona, obras pouco ou nada convencionais como a bateu na mãe de vinicíus, o autor
em crise de joseniz e o fantástico origami
de marcos ronin. Obras que surpreenderam visualmente e convenceram no tocante a
uma nova possibilidade de discurso e de narrativa foram essenciais (para essa
retomada da produção local). Destaco essas, como grandes surpresas, pelo
ineditismo da proposta. Sou fã incondicional do material da maturi e dos
trabalhos produzidos por Marcos Guerra e sua trupe, pelo Brum e a Milena, pelo
inconfundível Wanderline e por toda essa nova geração de artistas que vem
brotando da terra potiguar. Mas, destaco esses, como os trabalhos que me
surpreenderam positivamente no sentido de ousadia narrativa e estética. Também
é digno de nota, o incrível feito da equipe k-ótica ao lançar a primeira graphic novel do estado, o Evangelho segundo o sangue – com um
incrível trabalho de pesquisa histórica, além da presença da arte fantástica de
Leander Moura.
9 – Confesso que
já fiz uma lista de roteiristas potiguares que gosto, mas serei sacana e
restringirei a lista a três roteiristas que você considera nos últimos tempos
que produziram histórias interessantes e se possivel, fizesse um pequeno
comentário sobre sua opinião a cada um deles e suas obras?
Sacana,
é pouco! mas vou tentar utilizar como termômetro as minhas preferências
enquanto leitor e o conjunto da obra dessas feras.
Marcos
Guerra é uma unanimidade entre nós, pois
consegue escrever de tudo um muito. E é exatemente essa pluralidade de
possibilidades narrativas que conseguem nos envolver, encantar e nos faz
apaixonar por suas histórias. confesso que não sou fã de hqs de terror, mas foi
por intermédio de Guerra que voltei a ser apresentado ao gênero. Continuo não
sendo fã, mas passei a admirar ainda mais o seu trabalho, que já tinha me
conquistado em várias hqs publicadas pela k-ótica, como a excelente o outro lado do arco-íris, a hq regional a janela do vovô e o fascinante (e incompleto) mundo de aeternus.
Wanderline
Freitas também dispensa
apresentações. Sou fã incondiconal do multifacetário wandé. Seja esculpindo,
pintando, desenhando e escrevendo. Sim, ele escreve! e me identifico muito com
a sua linha de personagens de humor. Em especial, o atrapalhado urubuman e o impagável eni guimá. Mas wanderline é
multifacetário, lembram? E ele também escreve e desenha hqs com temas do
cotidiano, apimentadas de teor erótico, suspense policial e de super-heróis. Considero
ele um fantástico roteirista visual, pois a dinâmica de sua narrativa dispensa
o recurso do texto (mas ele usa e abusa, assim mesmo). É ruim deixar ele fora
dessa lista, heim?
Ivan Cabral é um mister quando se fala em síntese visual e narrativa.
Também sou um fanzaço do criador da mosca
zezé. Ele foi e continua sendo uma grande referência para mim, enquanto
cartunista. Contar uma história em no máximo três quadradinhos, não é para
todos. E o ivan, faz isso com muita propriedade. Além disso, a menção ao Ivan
pode e deve ser estendida a toda uma geração de precursores do quadrinho
potiguar, que também admiro pra caramba, mas o espaço no momento não permite
enumerá-los (tsc-tsc).
Sei que
esta lista está longe da unanimidade e que as idiossincrasias regeram a minha
escolha, mas a culpa não é minha, não! cacete no renato!!! o idelizador dessa
tortura. Lista tem que ser igual a das
compras do supermercado no final do mês: pelo menos trinta itens. Mas em épocas
de recessão e de grana curta...é o que temos para hoje...
10 – Não precisa
dizer que se você esta sendo entrevistado por mim é por que já o considero uma
promessa para o panteão dos roteiristas potiguares e promessa de grandes
historias para o futuro. Além disso espero muito de você, mas fora essa pressão psicológica qual suas
perspectivas de roteiros futuros e qual os outros gêneros de historias gostaria
de escrever?
Concluir
trabalhos interessantes que estão no meio do caminho como a série “os
notáveis”, “carcará”, “poderói”, “derme”, além do meu retorno ao universo das
tirinhas. Este é o meu grande compromisso para os próximos anos. Alguma coisa
mais autoral e experimental pode e deve pintar durante este processo, mas
somente pelo simples e mágico prazer de criar.
Agradeço ao Beto Potyguara pela entrevista e espero que a revisão apressada não tenha estragado o objetivo dessas entrevistas que é mostrar o empenho e a nobreza da arte através da escrita buscando dá uma visão holistica sobre sua construção através dos arquitetos das belas letras. Assim, conforme forem sendo enviadas as entrevistas elas vão sendo públicadas por aqui. Espero que todos os demais roteiristas potiguares contribuam para essa nossa conversa, já que penso que as hqs por ser uma arte sequencial em que reune por um lado as belas letras e por outro a imagem, no mínimo exige que algo seja escrito e desenhado, apesar de que penso que ambas a gráfia e a ilustração nada mais são do que o mesmo termo para uma arte mais nobre ainda. Bem espero que todos gostem das entrevistas e se possível for, comentem e nos dê um feed back.