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segunda-feira, 22 de junho de 2015

UMA AULA DE ESCRITA DE HQ POR QUEM ESCREVE




   

   
Escrever qualquer coisa por mais simples que seja  parece a princípio algo natural e fácil....parece? Quem já se aventurou pelo mundo da escrita sabe a dificuldade que existe em passar para o papel todas as idéias criadas, mesmo sabendo técnicas e artificios os mais variados que nos ensinam no colegio ou lemos nos manuais de redação, a sensação que fica é que a afirmativa acima descrita parece não se verificar quando examinada mais detidamente. A grande verdade que se constata tristemente é que escrever qualquer coisa por si mesma é trabalhoso e complicado. Os bons escritores tem mil e um artificios para descrever o que pensam os seus personagens, como também tem vasto conhecimento e determinado uso de "artificios" para aguçar a imaginação do leitor e facilitar a transmissão do real para o imaginário. O Escritor em suma trabalha sempre no domínio do "SE" em seus romances e contos, até mesmo nas resenhas ou artigo de opinião. E essa capacidade de criar "mundos", situações complexas em que os personagens são envolvidos passam a ingenua impressão de ser algo bastante fácil.  Mas o sentimento que temos, qualquer diante da folha em branco parece dizer o contrário e mostra como é complexo a produção de um texto escrito, mostrando inclusive como, em um primeiro momento, se mostra uma barreira intransponível entre o que se pensa e o que se pode escrever.

     Agora, some-se a isso uma linguagem inovadora e de vanguarda por que não dizer, que subverte todos os gêneros literários e que não só inaugura uma nova forma de linguagem que podemos até chamar de meta linguagem, como aquela que contribui para a complexidade da escrita como o que podemos encontrar na "narrativa gráfica" como bem o chamou o mestre Will Eisner. Me lembro como hoje quando li Narrativas gráficas do mestre Eisner e fiquei a princípio mais apaixonado ainda pelo universo das Historias em Quadrinhos pela forma como ele explicava a sua produção de maneira agil e elegante. Aquele livro, ráro na época nos primordios da decada de oitenta mudou completamente a forma como era feita os quadrinhos para mim. Naquele momento a idéia que tinha, não muito clara ainda, de que os quadrinhos de fato não apareciam simplesmente do nada, não era um ilustrador agraciado pelas pitonisas ou pelas ninfas da inspiração divina que sussuravam em seus ouvidos histórias incriveis e fantásticas que muitas vezes pareciam uma magnifica ode a alma. Na verdade escrever HQs era uma simbiose entre inspiração - técnica e trabalho duro por parte do escritor, ou como nós das hqs chamamos ROTEIRISTA. Claro que isso não inviabilizaria de um ilustrador talentoso também ser um escritor, um grande escritor como o foi o Will Eisner, o Frank Miller, Jim Starlin entre outros magnificos e fantásticos artesãos da narrativa gráfica, mas diga-se de passagem que a maioria que fazem parte do grande corpo de ESCRITORES de hqs, os roteiristas se centram e trabalham objetivamente com a escrita e exclusicamente vivem para ela.
     De fato, lembro-me nesse instante de nomes de peso que nos idos anos oitenta foram, pelo menos para mim grandes escritores de Hqs e são basicamente escritores e que merecem serem mencionados e relembrados com grande honra e interesse sem par. Autores como Alan Moore, Neil Gaiman, Grant Morriso, Chris Claremont, Len Wein entre outros magnificos roteiristas lá dos idos anos 80 e 90 pareciam estarem deslocados desse mundo insensível, imagina só a emoção de constatar que no pais em que moro também poderia falar com orgulho de que temos ROTEIRISTAS fantásticos que também eram capazes de nos surpreender com historias fantásticas. Só para não correr o risco de esquecer algum, pois eram muitos fico aqui com os nomes do grandes e fantásticos Júlio Emilio Brás, Sebastião Seabra, Deodato Borges pai,  como exemplo de autores dessa época que marcou uma geração. No meu caso quando comecei a fazer roteiros tenho que dizer que o culpado unicamente por isso atende pelo nome de Júlio Emilio Brás que me mostrou a possibilidade de que nós brasileiro podemos sim contar nossas historias e poder criar personagens interessantes me convenceu que eu poderia tambem seguir esse caminho. Mais pra frente quando tentava através de fanzines e da prática do desenho, já que não conhecia tantos desenhistas e os poucos que tinham eram preguiçosos o bastante ou talvez vissem minhas ditas historias muito pobres para chamar sua atenção e convencê-lo a ilustrar  (vai saber o que passa na cabeça dos seres humanos ou de ilustradores nessas horas). Me levaram a estudar desenho, anatomia e linguagem narrativa, lembrar sempre que não havia nenhum livro fora as da extinta Ediouro que ensinava isso e como não tinha dinheiro tinha de ser no olho e em publicações empretadas do Ivo Rocha que era um ótimo desenhista ao mesmo tempo que servia de inspiração para os iniciantes do lapis e me levou a aprender algo de desenho e consequentemente a fazer minhas próprias historias já que não havia quem apostasse nelas. Até esse momento, em minha cidade (Natal/RN) o predominio da maioria das hqs significativas estava centralizadas sobre a égide da Maturi e ocasionais fanzines de xeroz e publicações pobres e sem qualidade, que muito pouco me atraiam.
     Lembro-me que produzi algumas poucas hqs de forma comica em que era uma pobre versão de crise nas infinitas terras só com cachorros e distribui com amigos e familiares na ocasião. Houve outras criações como o do super heroi "Eterium" uma versão tosca do supla com o superman que também fiz uma hq e se perdeu no tempo (ainda bem"). Houve muitas outras coisas que fiz, mas sem o devido cuidado e esmero que só teria conhecimento de um roteiro mais técnico através de um pequeno exemplo de roteiro, na realidade uma ou duas páginas datilografado fornecido pelo próprio Ivo Rocha de como deveria ser feito um roteiro de hq. Me lembro que era do Júlio Emilio Brás o tal guia e atravez dessas duas ou três páginas pude começar a iniciar minha carreira (?) como um principiante ou mesmo aspirante a ROTEIRISTA. 

     Como mencionei acima, lá para a metade da decada de oitenta soube do livro Narrativas gráficas escrita pelo mestre Will Eisner e procurei encontrar algo dele que pudesse usar. Infelizmente as coisas naquela época não eram como agora que basta ir no Google e aparece o livro em pdf para baixar e tornar sua vida menos sectaria. Pois bem, foi novamente através de um conhecido que trocava quadrinhos na época que tinha umas páginas antigas que me emprestou as mesmas para poder ler e estudar como era possível conciliar imagem e texto em uma historia em quadrinho. Como podia descrever e expressar situações, passar emoções e estabelecer conexões com pensamentos do personagem principal com os dos personagens secundários. Aquelas dez ou doze páginas me deram uma noção que não tinha sobre a magia de escrever hqs até então. Realmente passei a prestar mais atenção a aqueles artifices do roteiro e como eles eram capazes de produzir algo tão fantástico como aquelas historias de super herois, detetives, de horror e até mesmo de sexo. Mas o que notei na época era que na realidade o livro mostrava como podemos produzir uma hq, explicava tudo do processo de elaboração até a formulação do personagem. Explicava tudo que era possível saber sobre a narrativa gráfica, mas um incomodo ainda me pertubava no intimo, sempre que via o livro do Eisner o que predominava era a narrativa visual, mesmo descrevendo como a melhor maneira de escrever uma historia sempre me deparava admirando mais a forma do que o conteúdo. Não estou querendo dizer que não havia conteúdo na narrativa do Eisner, mas que sentia que faltava a explicação de como ele chegava a idéia daquela narrativa especifica, parecia que ela estava pressuposta o tempo todo e mais ainda, partia de uma idéia que parecia estar circulando por ali próxima e a mão, cabendo ao escritor só pegá-la. Outras perguntas vinham, como aquelas historias eram feitas sem haver uma ligação com o mundo real, eram criadas a partir do nada ou tinham uma referência paupavel com exemplos externos? Eram muitas perguntas que só fui pensar e solucioná-las depois de muito estudo e leitura de obras que abordassem o tema, muitas vezes livros de roteiros de cinema e que não tinham uma relação direta com o mundo das comics, diga-se que tais livros eram ráros no Brasil, por que a maioria que ensinava minimamente a escrever roteiros eram de fora, mais precisamente nos EUA, a terra das comics.

    Contudo, esse limbo de publicações que pleiteassem a investigação da produção e explicação do conteúdo da narrativa gráfica começou a mudar timidamente mas só ficou mais efetivo na última decada do século 21 quando começou a aparecer obras que tinham o fim especifico de estudar e explicar como eram feitas os roteiros das Hqs. Nesse ponto é que desejaria chegar, especificamente os manuais que explicavam de forma fácil e descomplicada por assim dizer a produção de hqs. Começava a surgir livros de vários autores estrangeiros como por exemplo, dos americanos Will Eisner "Narrativas gráficas" que já mencionei e Scott Mccloud "Desvendando os Quadrinhos" e dos autores espanhois José M. Parramón e Jesús Blasco "Como dibujar historietas" (particularmente este último livro era do inicio da decada de 80 um dos pouquissimos livros que tinam como finalidade mostrar como construir um roteiro e foi ele que me salvou da ignorância total de como elaborar um "bom" roteiro). Contudo, faltava obras de autores brasileiros que tivessem como foco justamente a explicação da construção de  um roteiro de HQ e que no decorrer dessa decada começou a surgir obras como  Nobu Chinen "Linguagem HQ", Humberto Avelar "Quadrinhos guia prático"  e de Gian Danton o magnifico livro "O roteiro nas Histórias em quadrinhos" pela marca de fantasia que são livros técnicos mostrando passo a passo de como elaborar um bom roteiro ajudando assim os pretendentes a roteiristas de hqs a se orientarem nessa estética. Entretanto, para mim particularmente  sentia que faltava algo que acrescentasse a parte técnica uma explicação que evidenciasse a própria produção de uma HQ, a vivência, o relato, os problemas e soluções encontradas pelo roteirista e que os manuais de como construir roteiros de hqs esquecem que apesar de mostrar a parte técnica, não mencionam a vivencia com situações que fogem ao escopo do canone da técnica e que a primeira vista parece mostrar-se algo automático a produção de hq. Em resposta a isso nesse ano o Fantástico roteirista Gian Danton nos presenteia com um livro magnifico e que é a resposta a todas essas questões.

     Esse texto enorme é proposital, já que serve para mostrar a importância de tal obra para quem inicia, se podemos falar isso, a carreira de escritor de Historias em quadrinhos. A sua relevância mostra devido expor a carreira de um roteirista de hqs, onde podemos encontrar um relato da experiência pessoal como também mostra as saidas e formas (macetes por assim dizer) de solucionar possíveis dificuldades que foram aparecendo ao longo do tempo e nisso a gente vai começando a ver nossas principais dúvidas sendo respondidas no decorrer da leitura. A obra que expõe tão grata surpresa chama-se belamente "COMO ESCREVER QUADRINHOS" do Gian Danton a qual gostei muito de ler e de saber que as dificuldades que ele passou são as mesmas que passei e ainda passo de certa forma, e ajuda bastante para a elaboração e solução de possiveis dificuldades com a construção de um roteiro, principalmente aqueles mais complexos.

     Os anos de experiência escrevendo quadrinho de Gian Danton, acompanhado de sua escrita fácil e agil oriunda justamente da forma sintética e sucinta de quem escreve HQ mostra sem rodeios os percaussos que levam alguém a contar uma historia, além de discutir e mostrar por que a figura do Roteirista é tão importante para a arte sequencial. De fato, não há dúvidas de que o roteirista profissional, aquele que não sabe desenhar tão bem, mas tem de pelo menos ser o melhor no que faz escrevendo e imaginando aventuras, historias, isso leva tempo e leitura, é um eterno exercício em busca da perfeição se é que ela existe. O escritor de HQ não deve ser, apenas o leitor de hq, mas deve ler tudo de preferência. Isso que dizer que se o roteirista deseja dá profundidade psicologica ao personagem, retratar situações e ambientes com determinada veracidade, fazer experimentações com design de página, procurar utilizar o máximo que a nona arte tem a oferecer é necessário acima de tudo, pesquisa, estudo, leitura, esforço, ruminar por assim dizer idéias, escrever e apagar, avançar e voltar atrás, em suma, tem de haver comunhão com aquilo que se escreve, um pacto indissociável entre escrita e leitura de várias formas possiveis. Nesse sentido, o livro de Gian Danton mostra de forma fácil ao mesmo tempo profunda o processo mesmo de elaboração do texto de uma hq, e o próprio autor conversa com o leitor sobre o processo, não uma conversa chata e didatica, mas simplesmente uma conversa de alguém que já conheceu todo o percurso e deseja abreviar possiveis obstaculos aos noviço na profissão para que não cometam os mesmo erros no decorrer do processo objetivando mostrar os nuances de se escrever numa arte que envolve escrita e imagem e que não parece ser fácil de fazê-la.

    O livro descreve todo o percurso na elaboração de um texto de HQ desde a idéia inicial, a produção do Plot ( que seria uma especie de sintese da historia inicial contando de maneira geral os princípais pontos a serem abordados), depois o decalque (seria uma descrição um pouco mais aprofundada e explicativa de capitulos e dos personagens em si) e finalmente o roteiro propriamente dito. Cada etapa é discutido e mostrado com inumeros exemplos de hqs que o próprio Gian Danton roteirizou, com belissimas imagens, onde o autor mostra as dificuldades e alguns recursos que aconselha para que o novato no ramo possa seguir e não errar tanto no decorrer da construção do seu texto. A leitura do Livro de Gian Danton realmente é muito boa, flui, sai fácil e é claro o que ajuda bastante para aqueles que leitores que não estão habituados a livros extremamente profundos. Obviamente que isso não quer dizer que o COMO ESCREVER QUADRINHOS não seja profundo, ele é e muito. Principalmente a parte em que o Gian Danton faz uma critica a alguns ilustradores que desenham/roteirizam que nem se dão o trabalho de estudar sobre como se faz um roteiro antes e faz os piores erros possíveis, ráros são os desenhistas que conseguem fazer as duas coisas desenhar/roteirizar bem. Isso quando se preocupam com isso. Na realidade a critica do Gian faz sentido e isso sinto hoje em dia com vários conhecidos que ilustram e roteirizam suas historias e percebe-se logo diante de uma primeira leitura erros crasos de narrativa e de português, mas isso pode-se relevar, para mim o pior problema é recair no mais do mesmo, a saber, fazer uma versão deslavada de uma historia que nada mais é do que uma forma rala e sem conteúde de narrativa, por que o ilustrador/desenhista não tem a habilidade necessaria para traduzir o que tem em mente para o papel, isso deveria ser uma tarefa de alguém que treina unica e exclusivamente para isso ou que estude o mesmo para fazer tal empreendimento. Seja como for, no meu ponto de vista fico muito agradecido pelo envio e pela leitura do Livro COMO ESCREVER QUADRINOS do Gian Danton que recomendo mesmo a todos aqueles que tem a VONTADE e o DESEJO de contar e produzir suas historias para a arte sequencial ou HISTORIAS EM QUADRINHOS saibam que estão em boas mãos.

     Boa leitura e fica a dica. Até uma próxima.