sexta-feira, 6 de março de 2015

ENTREVISTAS COM ROTEIRISTAS POTIGUARES LULA BORGES






EMENTA: O objetivo dessas entrevistas é ressaltar o modo próprio de ser da profissão e trabalho do roteirista/argumentista nas obras de Historias em quadrinhos do RN, procurando mostrar como e o por quê o roteirista faz suas escolhas em detrimento do desenvolvimento de uma historia ao invés de outras. Buscando com isso, responder para o grande público leitor de hqs o que os motiva ou faz optar por contar historias do que ser um mero reprodutor delas. Além de compreender suas reflexões, anseios e opiniões sobre os quadrinhos potiguares e suas especificidades.

                                                                  MINI BIOGRÁFIA:

Lula Borges é desenhista, artefinalista, colorista e editor de quadrinhos, desenvolve roteiros desde 11 (1980) anos e atualmente se dedica a educação junto a arte e tecnologia como professor de artes no estado do RN, além de ser músico, cineasta, animador e empresário do setor de animação em Natal/RN, o qual trabalha desde 2002. A partir de 2010 trabalha com produção de filmes de ficção e documentários, além de desenvolver serviços específicos de modelagem 3D e efeitos especiais para produções audiovisual.


ENTREVISTA:

1 – Bem agradeço a disponibilidade de tempo, do ilustre roteirista para essa entrevista e já começo perguntando o que o levou a fazer roteiros sobre quadrinhos?

Eu que agradeço o espaço cedido, especialmente pelo fato de que normalmente se entrevista desenhistas, deixando os criadores das histórias sempre de fora,  tirando um ou outro grande nome, normalmente mundial. Comecei a criar roteiros a partir dos meus 11 anos, acredito, faz muito tempo, a idade do herói. Nunca fui um aluno muito extrovertido, tinha meus amigos, mas poucos e sempre andava sozinho. Lia muita revista em quadrinho da editora Abril, quase não conhecia as da Ebal, esta com muitas histórias de herois, como super-homem, Batman, Flash, pela Abril, normalmente eram revistas em quadrinhos de humor, como Pato Donald, Luluzinha, Scoobydoo, entre outras, mas tinha uma que me chamava atenção e passei a colecionar elas por alguns números. A Astos HB, uma coletânea da Hanaa Barbera com vários personagens, de todo tipo do mais zoomórfico, como Dom Pixote ao mais anatomicamente proporcional como o Homem pássaro ou Flash Gordon, eu adorava aquela revista. Ao ir a aula de educação física, no mês de setembro de 1982 criei meu primeiro personagem, o Superveloz, dai pra cá não parei mais.

2 – Ok, então sabendo de suas motivações gostaria de aprofundar mais o conhecimento sobre as hqs que te influenciaram, despertando você para esse universo dos quadrinhos?

O primeiro exemplo está ai, na primeira pergunta, no entanto, devo salientar que o primeiro incentivador foi o desenho Super Amigos, que passava na TV Globo pela manha, era o Globo Cor Especial e esse desenho me fez criar histórias surpreendentes e ingênuas também, no entanto, nunca parei de fazer esse tipo de história. Pois está no cerne dos leitores. Quando eu me proponho a ler ou ver alguma história eu crio um acordo com o que vou ler ou ver. O acordo é que a mesma seja verossímil para mim, independente de ser uma história espacial, religiosa, pré-histórica ou de ratos falantes. Eu sempre soube dessa peculiaridade em fazer histórias e o faço até hoje. Uma outra influência foram os filmes de Super Cine, das noites de sábado da também Globo. Falo assim da Globo pois, para nós seres midiáticos dos anos 1980, ou você assistia a Globo ou a TV Universitária, não existindo outra TV além das duas aqui em Natal. Bem, os filmes de Super Cine eram normalmente filmes Noar, o qual não existiam fins, não aqueles fins holliwoodianos ou mesmo fins que não eram comuns em filmes de outras sessões como tela quente ou sessão da tarde normalmente. Aos 14, 15 anos entrei numa escola de artes aqui em Natal, o Atelier Central que tinha um grupo de quadrinhos o GRUPEHQ e lá eu tive todo o aprendizado a fazer as histórias com os benditos começo, meio e fim que até aquela data eu sofria muito a fazer e também os grandes artistas que para mim foi uma porrada na cara, como João Antonio, Marcio José (hoje Marcio Coelho) e Gilvan Lira, mas principalmente o Carlos Alberto (galego), ele tinha um pensamento próximo ao meu enquanto os outros ou eram regionais demais ou eram ficcionistas demais, o qual não me ganhavam por certa arrogância e desmerecimento do meu trabalho, o qual queria trabalhar com super herois, enquanto todos, especialmente pela passagem política daquela época, ou queriam fazer algo muito ligado a nossa cultura, ou queriam fazer histórias espaciais, mas certamente contra os heróis típicos dos estados unidos. Nessa época também conheci a revista Heavy Metal e compreendi o que muitos deles queriam: uma Heavy Metal Tupininquim, mas na minha cabeça eu pensava: se eu sou um vendido ao império por ler e querer fazer super herois, eles são vendidos por lerem e quererem fazer essa Heavy Metal também e nunca parei de fazer meus personagens. Essas duas influências foram meu guia por um bom tempo e hoje ainda busco um meio termo entre as duas: histórias ingênuas que busquem algo diferente ao público.

3 – Então, observando suas motivações e influências quais os gêneros ou tipos de historias você desejaria escrever para os futuros leitores de seus quadrinhos.

Interessante essa pergunta, pois para quadrinhos quero continuar criando histórias de heróis, sempre, mesmo com o pouco tempo que tenho hoje, mas quando fala-se de histórias para filmes ou desenhos animados eu penso em algo totalmente diferente, falar do cotidiano, falar de pessoas, falar de magia, mas algo real, ligado ao dia a dia dos moradores de nossas ruas, dos pais e filhos que vão a escola; histórias para se emocionar, ter raiva, rir, sentir o coração pequeno em certas situações. Se algum dia surgir alguma ideia de filme de heróis, posso fazer em filmes, mas minha intenção disso é apenas para quadrinhos.

4 – Muito bem,  você poderia falar um pouco sobre a forma de escrever roteiros e suas preferências, além de se possível for, me responder qual a sua posição quanto a abordagem de temas delicados que por acaso você venha ou tenha escrito  e que nem sempre são temas muito fáceis de serem abordados e aceitos pelo grande público leitor?

Eu normalmente começo uma história pelo fim ou com algum fim, a ultima que criei foi sobre o descarte de lixo em uma animação de 12 minutos. Sabendo o tema, acho os personagens mais direcionados para o que vou escrever e começo. Nas minhas histórias é comum não haver vilões, ou ao menos inimigos muito fortes, necessitando do protagonista usar a inteligência para resolver ou a didática para tal. Isso pode parecer enfadonho lendo por aqui, mas vendo a história você vai dormir kkkkkkkkk . Só existiu um episódio o qual fui bastante criticado: o meu suicídio virtual, onde em protesto contra a fundação José Algusto e a Capitania das Artes eu fiz o papel de suicida e atirei na minha cabeça, não foi uma história muito bem elaborada, logo por que eu próprio era o ator também, mas por não avisar ninguém (nem podia), ao verem o vídeo, todos que eu conhecia no Brasil, se comoveram, outros se indignaram comigo, outros com o sistema, enfim, foi uma performance que acabou influenciando as opiniões do povo todo, no outro dia informei que era um ato de protesto de minha parte contra o sistema cultural do Rio Grande do Norte e acabei por criar inimigos que até hoje não falam comigo e amigos que nunca me deixaram na mão. O vídeo está no youtube https://www.youtube.com/watch?v=uYVTx8Z1FEU e pode ser assistido a qualquer hora. O ápice é depois dos 9 minutos quando finalmente puxo o gatilho e “morro” . Existem outras histórias a contar, mas essa foi a mais forte. Fora isso minhas histórias são sempre, como falei acima, ingênuas e fáceis de “beber”

5 – Você possui alguma pretensão de desenvolver uma a estética própria em sua escrita que tenha como objetivo experimentar através de seus roteiros?

A estética é um desenvolvimento que só o tempo vai definindo. A cada história criada, um pedaço do artista fica na mesma e experimentar é a máxima em toda história. Acredito que venho fazendo um trabalho contínuo, desenvolvendo histórias que acabam por ser um pouco de mim e ao mesmo tempo falar um pouco do outro. Quero ainda fazer muitas histórias, assim o mundo saberá quem sou ao mesmo tempo que falo do próprio mundo.

 6 – Essa pergunta é capciosa, para não dizer sacana, mas necessito fazê-la, você se considera um roteirista de que tipo? Comercial que escreve para vender e divulgar o seu trabalho apenas, Independente que objetiva escrever para um determinado público, desejando uma liberdade maior de criação ou ser Alternativo (underground) que procura a experimentação e a liberdade de expressão, apenas, sendo que o público consumidor seria apenas uma consequência e não o objetivo principal?

Comercial, com certeza, mas todas essas especificações acabam por ser uma só. Você é comercial seja onde for. O alternativo (underground) afirmado na pergunta tem seu nicho, com o segmento quem compre, então é comercial de qualquer forma. No entanto o que respondi é que quero fazer histórias para a massa, consequentemente, conforme os românticos do século dezenove, tenho que ganhar meu público a cada história, enquanto vou tentando, acabo por ter que fazer tudo as minhas custas, sendo um independente, no final das contas.

7 – Muito bem, considerando que como quadrinista inserido em uma região do país, a nordestina em que temos a carência de tudo há décadas, qual a perspectiva atual do mercado de Hqs nessa região e especificamente, o quadrinho potiguar?

Até algum tempo atrás eu não via muito futuro no quadrinho regional ou potiguar histórias muito parecidas, desenhistas preguiçosos, falta de estrutura de vendas, que é o mais importante, no entanto com a entrada das feiras de quadrinhos, de cosplay, lojas específicas, acredito, hoje que tenhamos futuro, ao menos por algum tempo. Devemos investir em roteiristas cada vez mais pois é a partir deles que surgem as histórias, as lendas, os mitos e, claro , o comércio, as vendas, o lucro. Acredito que possamos ainda viver tranquilamente por algum tempo com essa expectativa, inclusive com artistas fazendo trabalho para outros estados e países. Isso dá um gás a mais na produção e consequentemente consumo.

8 – Nessa perspectiva, gostaria de saber quais as hqs POTIGUARES que lhe despertaram alguma curiosidade e lhe surpreenderam em algum sentido nesse ou em outros anos?

Certamente a Maturi foi a minha primeira referencia quanto a quadrinhos no RN, a revista igapó, Tabefe, Gibizine, entre tantas outras que me somem da memoria, mas a maior influencia mesmo foi a Epopéia potiguar, criada por Galego e Luiz Elson, com histórias de super herois e sátiras aos mesmos. De minha parte, no final dos anos 90 finalmente criei minha própria publicação junto a Miguel Everaldo, a Bio 47, nos moldes da Epopéia, mas surgiram  outras publicações criadas por nós como The Negão, de Eduardo Kowalewski e também Portal do Infinito, que teve apenas uma edição e era voltada ao terror, suspense, mas não houve novas histórias para dar continuidade. Além da premiada Brado Retumbante, certamente uma referencia para publicadores futuros. Falei dessas publicações, pois possivelmente poucos conhecem, mas que no futuro, de alguma forma possa fazer parte de referencias de novos quadrinistas.

9 – Confesso que já fiz uma lista de roteiristas potiguares que gosto, mas serei sacana e restringirei a lista a três roteiristas que você considera nos últimos tempos que produziram historias interessantes e se possivel, fizesse um pequeno comentário sobre sua opinião a cada um deles e suas obras?

Emanuel Amaral (guerreiro das dunas), Francinildo Sena (criador do Crânio e, acredito, o maior roteirista do RN, tanto pela quantidade quanto qualidade dos roteiros) e o imortal Edmar Viana (pivete). Existem outros que gostaria de expor, mas a quantidade pedida, faz uma peneira aparecer no nosso pensamento.

10 – Não precisa dizer que se você esta sendo entrevistado por mim é por que já o considero uma promessa para o panteão dos roteiristas Potiguares e promessa de grandes historias para o futuro, além disso espero muito de você, mas  fora essa pressão psicológica qual suas perspectivas de roteiros futuros e qual os outros gêneros de historias gostaria de escrever?

Além de quadrinhos, eu sempre trabalhei com animação, desde 2002 e filmagens de ficção e documentários, a partir de 2010. Acredito que esse é o caminho natural dos roteiristas de quadrinhos. No meu caso já tenho vários curtas metragens e estou desenvolvendo alguns roteiros de longas metragens tanto em animação quanto em live action. Dois deles já estão desenvolvidos, necessitando apenas ajustes pontuais, um sobre parte da minha vida e outro uma aventura histórica, fora isso tenho vários roteiros de filmes de longa de ficção científica que gostaria de desenvolver, mas com mais calma, falando necessariamente do início de destino da raça humana. Não trabalho muito com ficção científica, mas temos nossas ideias sempre não é isso?

Agradeço novamente o espaço dado para que eu pudesse deixar algum registro para a posteridade.
Meu canal no youtube: www.youtube.com/lulareverbo
canal no face, procure lula borges


Comentários
1 Comentários

1 comentários:

Este comentário foi removido pelo autor.

Postar um comentário