segunda-feira, 12 de janeiro de 2015

Pôesia não!

Não ligo se aquele velho safado estava certo em dizer que "nos inventamos" e esse é motivo de não darmos mais certo. Ou porque não estávamos distraídos o suficiente? Não ligo de dançar abraçada com a camisa suada do trabalho que esqueceu jogada na minha mesa de estudos. Não me importo de ler poemas falando dos olhos verdes, da pele riscada, das pernas longas... Não ligo mais de admitir pra minha mãe que mesmo com todas as pessoas que passaram pela minha vida, meu coração corta o cabelo no barbeiro por 10 contos. Não importa os olhos marejados e orgulhosos dela admirando minha coragem de tentar não te amar mais, mesmo sendo a melhor coisa que eu faço depois de colecionar cabelos. Não importa, pois você não sabe arrotar e eu não sei cuspir. Botamos tudo pra dentro num goto seco, engolimos tudo, com e sem conotações sexuais. Não me importa que fume seu cigarro de filtro amarelo dentro de casa, porque as piúbas abandonadas no meu cinzeiro deixam o ar de aconchego na sala.
Não ligo que não sonhe em comprar casa, nem em ter filhos cagões, eu também nunca os tive com você, mas imagino o tamanho do nariz da criança que gestaria em segredo por pura sorte. Quero mesmo é perceber na nossa "selfie de pé", o volume da sua calça crescido enquanto me carrega no cangote pra que eu sinta melhor aquela "eco felicidade" que tanto debocha. Não ligo pras promessas que você esqueceu ou pra grana que te emprestei dois anos atrás pra quitar a conta atrasada do cartão que pagou o motel onde eu não dormi. Não ligo pras suas mensagens de boas festas. Nem ligo pra distância das nossas curvas, e isso é mentira, mas não retiro a frase porque soa bonito. 
Eu ligo sim, com o carinho que não sentiu nos seus cabelos enquanto assitia o verdadeiro ultimo episódio do Ultimo Programa do Mundo, importo sim  com meu jeito de não saber o que dizer no chat dos sem face e com a tranquilidade de ficar em silêncio do seu lado mesmo não conseguindo parar de falar um segundo. Interessa a menstruação da sua cachorra, as recaídas do seu pai, os cuidados da sua mãe, se nossa fruta preferida apodrece na geladeira. Se não consigo, não posso e não tento te fazer sorrir, se fica medindo as palavras para falar comigo feito um pseudo poeta da cidade, quando eu te vi escrevendo seu primeiro verso sobre o amor. "Poesia não"!
Mesmo ligando com o fato de não ficarmos juntos pra sempre, porque morrerei de envenenamento em 16 de março de 2054, não admito esquecer um dia se quer seu cheiro misturado ao perfume francês "original" que roubou da sua mãe. Mesmo não ligando, o tempo passando depois de ter te perdido no ultimo voo saindo de viracopos, continuo ensaiando todos os nossos diálogos intermináveis sobre blues e sitcoms falidas. Eu ligo pra história das marcas novas na sua mão que reparo enquanto vê os lances da NBA, pra coloração dos seus sinais, pra sua dor de dente, pra sua pele queimada pelo sol, pras notas erradas da sua guitarra. Talvez não note o quanto deveria ou não fale o quanto notei cada detalhe das cores no seu olhar, mas é que odeio palavras. Por isso as mando no e-mail para mim mesma com titulo: "pôesia não".

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