segunda-feira, 10 de fevereiro de 2020

FOLCLORE NAS HQS NORDESTINAS COMO SINTESE DA VIDA.


         
          O cenário nacional mais interessante, na minha muito humilde opinião, esta na produção das hqs alternativas, a preocupação dos autores que objetivam narrar uma história, representando nossa cultura de certa forma. Realmente, é louvável e até mesmo inovador essa ideia. Essa perspectiva é destoante do que vem se apresentado ao leitor. Somos essencialmente habituados a consumir publicações que vem de fora, de outros lugares, como EUA, Europa e Japão. 
        Pouco são os leitores que deixam de consumir algo desse cardápio para prestigiar o que se produz nacionalmente. A invasão de conteúdo externo também é uma invasão cultural, pois sempre “preferimos o que é produzido de fora porque o nacional deixa a desejar” – assim diz um leitor a mim.
            Fiquei em casa remoendo essa última frase e me perguntando – onde raios essa criatura andou nas últimas duas décadas? O quadrinho independente e alternativo é tão bom é de qualidade excelente quanto qualquer hq externa, isso é um fato! Obviamente, existe muitas que não o são, como também existe nas hqs estrangeiras. O fato é que existe na produção nacional qualidade e diversidade magníficas capazes de rivalizar com o as novelas gráficas expostas por aí.
            Refletindo a partir de constatações como essa, pensei mais um pouco e conclui que se os quadrinhos nacionais estão em nível de igualdade com os estrangeiros o que seria necessário para diferenciá-lo da concorrência?  Penso que temos aqui um motivo para nos aprofundarmos um pouco mais em nossas considerações sobre um aspecto relevante da enorme produção nacional, a saber, hqs que tenham como tema o folclore nacional. Não pretendo listar aqui as várias publicações que abordam esse tema específico, pois temos blogs que fazem isso melhor do que eu. Mas minha pretensão esta em considerar o assunto e indicar três obras nacionais que tenham esse tema e fazer minha breve resenha sobre elas, depois expor algumas considerações a respeito.
            A primeira obra que vou indicar chama-se Maldito Sertão – Já, sei, já sei de novo falando sobre o Maldito Sertão!! Vai confessa que está ganhando um trocado pela propaganda nê? Não, não estou, mas o objetivo aqui é fazer uma análise da relevância do tema para a produção nacional e mostrar que esse pode ser um caminho viável de alternativa para o material homogêneo que está aí.
            Maldito Sertão é uma adaptação da obra de mesmo nome do escritor potiguar Márcio Benjamin. São contos que tem como tema o folclores brasileiro e seus causos. A Novela Gráfica tem como autores Cristal Moura, Mário Rasec, Leander Moura, Renato de Medeiros Jota e Rodrigo Xavier, todos eles fazem parte do coletivo Quadro9 responsável por transformar o livro de Márcio Benjamin em quadrinhos. Nesse sentido, vale salientar uma importante contribuição do grupo a produção da hq ao mesmo tempo que esta em sintonia com o autor original, no caso Márcio Benjamin; os contos adaptados para hq são adaptações não transliterações iguais. Algumas vezes bem mais sombrias. A parceria com o escritor potiguar deixa a interpretação dos mitos e dos escritos submissos a imaginação do grupo o que rendeu uma obra impar e totalmente independente. Vale a pena ler e constata até onde os mitos podem reder histórias de arrepiar o cabelo da espinha.
            A segunda hq que pretendo abordar aqui é a hq Mapiguari de Deuslir. Essa hq fez parte da primeira leva de quadrinhos publicados sobre o projeto primeira edição supervisionada por Luiz Elson. Nessa hq Deuslir aborda a figura folclórica do Mapinguari que segundo o dicionário cascudeano “É um animal fabuloso semelhando-se ao homem, mas todo cabeludo. Os seus grandes pelos o tornam invulnerável”. Na história o autor da hq aborda a história de forma fantasiosa no qual o mito e uma criança possuem uma interação bastante peculiar. A história transcorre com uma narração fluída e concisa, até porque penso que foi projetada para ser assim. Não é uma edição luxuosa, a capa é couche mas o miolo é de papel pisa-bright penso, o que pode incomodar alguns leitores mais melindrosos, mas recomendo a leitura fortemente.
            O terceiro quadrinho que desejo recomendar tendo como tema o folclore, só que sob o aspecto do cangaço, é O olho do diabo. Obra magnifica tendo o autor Monzart Couto como escritor e ilustrador, considerado o Miguelangelo dos quadrinhos.  Nessa hq podemos mostrar a versatilidade de Monzart ao brincar com o folclore e o cangaço em suas histórias. Ele visa explorar os limites dos mitos brasileiro ao mesmo tempo que o autor mineiro busca aprofundar o horizonte do cangaço, não como narrativa congelada em um momento histórico, mas de expor sua elasticidade como tema possível de ser tratado de diversas maneiras.  Sempre gosto dos trabalhos competentes de Monzart Couto, ele é genial e um dos poucos que sabe trabalhar com o cangaço e o folclore no qual está envolto.
            Todos esses quadrinhos acima descritos pretendem descrever o ambiente e cultura nordestina. Por isso a fauna, a caatinga, a vida do sertanejo e seus mitos e...monstros, isso mesmo monstros, são motivos e temas de suas histórias! A região nordeste com suas peculiaridades são um lugar efervescente de histórias prontas para ser contadas, sejam elas escritas ou descritas por hqs. Os autores teem nessa cultura um manancial promissor e bastante fértil para tomar como base para suas histórias em quadrinhos. Atualmente o tema que aborda esse cenário nordestino, como pano de fundo de suas histórias, vem sendo feitas com regularidade.
            É maravilhoso perceber como esse cenário desértico, inóspito e árido que deveria ser motivo de resistência dos autores a evitar o assunto, fez o contrário, tornou-se uma força motora responsável pela ascensão do tema entre os autores. Mas nem tudo são flores, pois aqueles que se dignam explorar esse tema, ainda fazem timidamente e poucos são os que realmente entendem do tema. Considerando a irregularidade de autores de outros estados e até mesmo do próprio nordeste que não centraliza suas histórias nesse cenário. Fica evidente que explorar o folclore nordestino, o cenário e os mitos podem proporcionar histórias maravilhosas e bastante interessantes. Seja como for, posteriormente pretendo retornar esse assunto, devido  existir muitos exemplos de autores que abordaram brilhantemente esse tema. Fico por aqui e abração a todos!!!


Renato de Medeiros Jota      

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